Como montar seu roteiro de viagem à Europa

Costumo dizer que toda ida à Europa é como se fosse a primeira. A menos que você volte exclusivamente a lugares que já visitou, toda nova viagem suscitará as mesmas perguntas iniciais. Por onde chegar? Quantos dias ficar em cada lugar? Que meio de transporte escolher? Use este tutorial como ponto de partida para destrinchar suas próximas viagens européias.

Primeiro passo: NÃO compre a passagem aérea

Comprar uma passagem por impulso é o erro mais comum de (falta de) planejamento numa viagem à Europa. Achar uma passagem superdescontada de ida e volta a uma cidade específica só garante a viagem de quem só queria ir para aquela cidade. Continuar a viagem a partir dali — e sobretudo voltar para lá para pegar o vôo da volta — pode anular a economia e, pior, causar enormes perrengues logísticos. Só compre a passagem depois de ter definido todo o itinerário (continue lendo e veja por quê).

Itinerário: menos é mais

Ao montar um roteiro pela Europa, use o método clássico recomendado para arrumar malas: selecione todos os lugares que você gostaria de visitar, e então reduza à metade. Ou a um terço. Na excitação da montagem do roteiro, nossa tendência é empilhar todos os lugares que estejam no caminho (e fazer longos desvios para chegar a outros).

No mapa, tudo parece perto. Mas números frios, como quilometragens e durações de vôos, não levam em consideração o tempo que se gasta em arrumar a mala, fechar a conta do hotel, deslocar-se ao aeroporto (e chegar com a antecedência necessária para o check-in), vencer o trânsito dos anéis viários para sair de cada cidade e entrar na próxima (em viagens de carro), encontrar o próximo hotel, fazer o check-in, subir com as malas…

Cada troca de local envolve a perda de pelo menos meio dia (e de muita energia). Acredite: quanto mais você troca de cidade, menos você aproveita o seu tempo.

Cidades grandes: fique quatro dias

Sim, toda cidade importante da Europa tem um ônibus de dois andares que percorre todos os cartões postais em um dia só. É um pecado, porém, limitar-se a simplesmente constatar ao vivo a existência de monumentos que você já conhecia antes de sair de casa.

Quatro dias são o mínimo necessário para você entender o básico de uma grande capital. No terceiro ou quarto dia dá-se o clique: de repente todas as fichas caem e você começa a se localizar. As obrigações turísticas (os lerês) diminuem, e você começa a se sentir um pouco morador. É uma sensação que você só vai entender quando se deixar ficar pelo menos quatro dias numa grande capital.

(Se essa capital se chamar Paris ou Londres, pense em ficar sete dias — no fim, você ainda vai achar pouco.)

Monte a viagem em módulos

Um jeito bastante simples de resolver o seu itinerário é dividindo o tempo de viagem em módulos de 5 a 7 dias. Aloque cada módulo a uma metrópole (Lisboa, Roma, Munique) ou a uma região que você queira explorar de carro ou trem (Provence, Andaluzia, Highlands, Toscana). Permaneça na cidade grande por toda a duração do módulo; nas viagens de carro ou trem, tente resolver o roteiro em no máximo duas bases.

Bate-volta: veja mais, canse menos

A melhor maneira de extrair o máximo das bases que você escolher é o bate-volta. Toda cidade que não justifique um pernoite e que fique a no máximo uma hora e meia de viagem de onde você esteja rende um passeio perfeito. Você não precisa fazer check-out, viaja sem malas (de trem ou de carro) e, ao chegar, aproveita desde o primeiro instante (sem perder o pique com atividades chatas como encontrar o endereço do hotel e fazer check-in). Se você não se exigir demais, ainda volta para o local em que está hospedado com energia para aproveitar a noite. Férias, lembra?

Pit stop: saiba usar

Trajetos mais longos entre uma base e a próxima — tanto de carro, quanto de trem — ficam mais divertidos quando você pode fazer uma parada estratégica no caminho.

Por exemplo: Bruxelas entre Paris e Amsterdã; Dresden entre Praga e Berlim; Pompéia entre Roma e a Costa Amalfitana.

Para lançar mão desse recurso, porém, é preciso ter cuidado extra com a bagagem. Estando de carro, pare em estacionamentos vigiados e em hipótese alguma deixe a bagagem à mostra. Em viagens de trem, certifique-se de que a estação do pit-stop dispõe de guarda-volumes. Pesquise na internet: “lockers”, “left luggage”, “consigna”, “consigne” e “deposito bagagli” associado ao nome da estação.

A passagem aérea? NÃO compre ainda!

OK, você já definiu o seu roteiro. Dividiu seus quinze dias em dois módulos de cidades grandes e um de região. Mas ainda falta mais um passo antes de emitir a sua passagem aérea: definir o(s) meio(s) de transporte dentro da Europa.

Avião, trem ou carro?

O trem é o meio de locomoção europeu por excelência. Para comparar a duração de viagens entre trem e avião, acrescente sempre três horas ao tempo de vôo — é o mínimo de tempo extra que você leva para ir e voltar do aeroporto, fazer check-in e esperar bagagens.

Mas não use trem (nem carro) para atravessar o continente; para isso existe o avião. Evite também trens noturnos: teoricamente você ganha tempo, mas na prática o que ganha é uma noite mal dormida — e de quebra ainda fica cansado para aproveitar o dia segiunte.

Carros e cidades grandes não combinam: o GPS ajuda, mas não elimina o stress do trânsito e da busca de estacionamento.

O carro é perfeito para deslocar-se por estradas secundárias, sem horário nem programa rígido; não por coincidência, as regiões mais apropriadas para explorar de carro são aquelas em que o trem não dá conta do recado (Toscana, Provence, Costa Amalfitana, Sicília, Andaluzia, Portugal, Rota Romântica).

Trem: passe ou ponto a ponto?

Passes de trem não valem mais a pena: os dias de uso são limitados e é preciso fazer reserva e pagar suplementos para usar os trens rápidos.

O melhor é fazer os trechos de trem com passagens avulsas, aproveitando tarifas descontadas. Compre diretamente no site da companhia ferroviária do país de origem de cada trecho.

Os únicos passes que continuam um ótimo investimento são os passes nacionais de países que não exigem reservas ou suplementos para uso de seus trens regulares: é o caso da Suíça (Swiss Pass) e da Alemanha (German Pass).

Low cost ou não?

Veja bem: aquelas tarifas incríveis de 5 ou 10 euros que fizeram a fama das companhias low-cost da Europa são tão difíceis de conseguir quanto as promoções que as aéreas brasileiras fazem de madrugada. Há muitos custos extras: para despachar a bagagem, para fazer check-in (mesmo pela internet!), para comprar com cartão de crédito, para marcar assento. O limite de bagagem é avarento (entre 10 e 20 kg) e cada quilo de excesso é cobrado (pelo menos 10 euros por quilo de excesso!). O mais comum é que cada trecho, sem multa de excesso de bagagem, saia em torno de 80 euros.

Antes de sair comprando low-cost a torto e a direito, descubra quanto custaria incluir esses trechos na sua passagem aérea Brasil-Europa-Brasil. Pesquise também quanto custa comprar os trechos internos avulsos nos sites das cias. aéreas convencionais. Com antecedência, costumam oferecer tarifas competitivas nas mesmas rotas.

AGORA SIM: compre a passagem aérea

Depois de definir o roteiro e os meios de transporte dentro da Europa, aí sim você está pronto para comprar a passagem aérea mais adequada.

Compre a sua passagem pelo menos até o primeiro destino que você vai efetivamente visitar, voltando do último destino do seu itinerário. Não se prenda aos vôos diretos, nem às companhias aéreas do primeiro ou do último país do seu roteiro. Qualquer aérea pode emitir uma passagem do Brasil a Veneza, com volta ao Brasil desde Praga. O que vai mudar é o aeroporto de conexão.

Definido os pontos de chegada e partida da Europa, orce quanto custa incluir os trechos aéreos internos que você vai precisar fazer entre um módulo e outro do itinerário.

Se cada trecho custar menos de 100 euros (110 dólares), será um bom negócio pela conveniência e pela segurança. (Lembre-se: é difícil conseguir low-costs por menos de 80 euros o trecho, e com as low-costs as conexões não são garantidas e o excesso de bagagem é cruel.)

Passagens multidestinos podem ser compradas com agentes de viagem ou em todos os sites (incluindo aí os das próprias cias. aéreas) que ofereçam a opção “múltiplos destinos” ou “várias cidades”.

Quando é melhor fazer as reservas?

Quanto mais cedo você comprar as passagens aéreas, melhores preços deve encontrar (sobretudo se você quiser achar as barbadas das low-costs).

melhor momento para reservar hotel é exatamente três meses antes da data de hospedagem: é quando as tarifas descontadas aparecem nos sites de reservas de hotéis. Note que os melhores descontos normalmente requerem débito imediato; leia as condições de cancelamento antes de fechar negócio.

Os trechos de trem são lançados nos sistemas das companhias ferroviárias entre 90 e 60 dias antes da data de viagem; as tarifas promocionais aparecem sempre neste momento e esgotam logo.

Dois meses antes de viajar, marque as visitas que podem ser reservadas pela internet: Galleria Uffizi em Florença, Museu do Vaticano, subida à Torre de Pisa, entrada na Alhambra…

Cartão, débito ou dinheiro?

Não existe meio de pagamento perfeito no exterior. Todos tem prós e contras.

Levar dinheiro vivo faz você evitar os 6,38% de IOF (o imposto baixa para 1,1%). Mas tem que levar a moeda certa, senão você pode perder bem mais do que isso nas operações de câmbio.

Usar cartão pré-pago (tipo “travel money”) é bem mais seguro do que levar dinheiro vivo. Mas você paga 6,38% de IOF.

Tirar da carteira o cartão de crédito é cômodo, seguro e pode render milhas. Mas além dos 6,38% de IOF, você está sujeito à variação cambial: se o real desvalorizar entre o momento da compra e o momento do pagamento da fatura, você tem gastos extras.

Para países de moeda forte: leve a moeda do país

Compre dólar para viajar aos Estados Unidos, euro para a zona do euro e libra para o Reino Unido. Parece óbvio, mas com a desvalorização do real tem gente comprando dólar para levar para a Europa só porque está mais barato do que o euro, ou levando euro para o Reino Unido só porque está mais barato do que a libra.

É um erro: do mesmo jeito que o euro vale mais que o dólar no Brasil, também vale mais do que o dólar na Europa, na mesma proporção. Ao trocar o seu dólar por euro na casa de câmbio na Europa, você vai pagar a diferença que achou que estava economizando, e ainda vai perder mais uns 3 a 5% na operação cambial. (Já reparou como o câmbio tem sempre duas cotações, uma mais alta e outra mais baixa? Funciona assim: na hora que a gente compra, paga a cotação mais cara; quando vende, recebe pela cotação mais barata.)

Levar dólar para os Estados Unidos, euro para a zona do euro e libra para a Inglaterra apresenta duas vantagens insuperáveis: você compra no Brasil por uma cotação justa (é alta, mas, acredite, é o que vale) e durante a viagem pode usar o dinheiro diretamente no comércio, sem passar novamente por uma casa de câmbio.

Teoricamente, o mesmo raciocínio valeria para outras moedas fortes, como franco suíçodólar canadensedólar australianodólar neo-zelandês e yen japonês. Mas muitas dessas moedas são vendidas por uma cotação mais cara do que deveriam; normalmente valem mais a pena no cartão pré-pago do que como dinheiro vivo (provavelmente porque não há muito dinheiro em espécie dessas moedas em estoque por aqui).

Quer saber como determinar se a cotação é justa ou não? Veja a diferença entre as cotações de compra e venda. Se a diferença estiver entre as duas cotações estiver em torno de 10% (pode passar um pouco), a cotação está OK. Se a diferença entre as duas cotações estiver na faixa de 20%, então a moeda aqui está cara demais. Nesse caso, valerá a pena comprar dólar e trocar pela moeda local no país.

Para países de moeda fraca: leve dólar ou euro (ou use cartão!)

Com o dólar alto, muita gente passou a achar que é vantagem comprar peso argentino, peso chileno, peso uruguaio, peso mexicano, peso colombiano, nuevo sol peruano aqui no Brasil. É tudo tão baratinho, não? Custa centavos (o peso chileno custa milésimos de real!).

Ilusão, gente. TODAS (repetindo: TODAS) essas moedas estão supervalorizadas no nosso mercado. Se você for ver a diferença entre as cotações de compra e venda, dá 20%, 30%, chega a 40%! (O dólar e o euro mantêm uma diferença de 10% entre as cotações.) É um mau negócio. Até cotação de casa de câmbio de aeroporto, que normalmente é ruim, consegue ser mais vantajosa do que as cotações dessas moedas aqui no Brasil.

(Exceção à regra: em lugares de fronteira, a cotação da moeda do país vizinho fica vantajosa. Por exemplo: vale a pena comprar pesos argentinos em Foz do Iguaçu. Ou em lugares com colônia argentina, como Búzios e Bombinhas.)

Se você vai para país de moeda fraca, leve dólar ou euro. Do mesmo jeito que dólar e euro valem muito aqui, valem muito também no Peru, no México, na Hungria, na Turquia, na República Tcheca, na África do Sul. Mesmo fazendo duas operações de câmbio (para comprar o dólar ou o euro aqui, e vender no país da viagem), você ainda perde menos dinheiro do que se comprar a moeda fraca aqui.

Quando precisar trocar seu dinheiro, evite as casas de câmbio de aeroportos e próximas a atrações turísticas: essas oferecem as piores cotações. Nos fins de semana também a cotação baixa; troque o estritamente necessário. Na Europa, descubra as agências de banco que têm setor de câmbio; elas oferecem cotações mais vantajosas que as casas de câmbio.

Mas se você não quer esquentar a cabeça e perder tempo de suas férias fazendo cálculos e procurando casas de câmbio com cotações justas, use cartão de crédito. Garanto para você que, na média, por oferecer sempre uma cotação justa, a qualquer hora do dia e em qualquer dia da semana, o cartão pode fazer você perder menos dinheiro do que a troca em casas de câmbio.

Não leve reais. Você vai fugir do dólar alto mas vai encontrar uma baixa cotação do real em praticamente todo lugar.

Faça o cartão na moeda do país

O melhor desempenho do cartão pré-pago é quando a moeda carregada no cartão é corrente no país que você vai visitar. Se o seu cartão pré-pago for carregado com dólar, você não perderá nada ao fazer gastos em dólar nos Estados Unidos. Se o seu cartão pré-pago for carregado com euro, você não perderá nada ao fazer gastos em euro na zona do euro.

Mas se você usar seu cartão pré-pago carregado com dólar num país onde a moeda é o euro, você vai perder de 3 a 5% de conversão cambial. Exatamente como se você pegasse dólares vivos e fosse trocar por euros vivos numa casa de câmbio.

Além do dólar, do euro e da libra esterlina, existem cartões pré-pagos carregáveis em dólar canadense, dólar australiano, dólar neo-zelandês, franco suíço e yen japonês, que podem ser boas alternativas para quem vai viajar para esses países. Se a diferença de cotação de compra e venda estiver próxima, ou ligeiramente acima, de 10%, o cartão vale a pena. Se a diferença estiver em torno de 20%, você vai perder menos se levar cartão em dólar.

Leve o seu cartão, mesmo se não for usar

Ainda que usar cartão de crédito não esteja nos seus planos, não esqueça de levar na carteira, devidamente desbloqueado para uso no exterior.

Primeiro, porque um cartão de crédito no bolso é o melhor plano B para qualquer emergência.

E depois, porque um cartão de crédito internacional é indispensável em todas as operações que exijam caução (ou “bloqueio”, no jargão do meio). Você não vai conseguir alugar carro sem um cartão, e alguns hotéis também vão fazer um bloqueio preventivo para cobrir diárias e extras.

Sem cartão de crédito você tampouco conseguirá comprar ingressos e tours antecipadamente online.

Fonte: Viaje na Viagem, por Ricardo Freire, nosso mestre inspirador desde 2004.